segunda-feira, 22 de fevereiro de 2010

A amizade

— Puta que pariu! Que vontade de fumar...

— E é um descontrolado, é? Acabasse de fumar um cigarro agora na conveniência.

— É que tenho agonia de ficar muito tempo viajando!

— E daí?

— Daí que tenho que fumar.

— Pra quê?

— Porque eu quero, eu preciso.

— Certo. Vá fumar no banheiro do ônibus, ora.

— Porra, você é um gênio — disse Eduardo, dando-lhe um beijo na testa forçado. Rômulo não gostou muito do carinho. Ele era um pouco machista e sabe-tudo.

— Isso um dia ainda vai te matar! — alertou ele.

— Todos vamos morrer um dia — ironizou Eduardo, com a prepotência de todo fumante ciente de seu calvário. — Fumo porque me faz bem.

— Mas não faz. Você sabe que só um cigarro desses tem mais de quatro mil substâncias que fazem mal à saúde!

— E o que faz bem? Comer alface?!

— Não seja idiota. Você sabe que faz mal de verdade. E muito.

— Não seja idiota. Eu fumo, porque me faz bem; me sinto bem fumando.

— Pois morra... — declarou Rômulo, fingindo estar nem aí pra seu melhor amigo.

— Morrerei quando Deus quiser.

— Que nada. Você tá é acelerando o processo! A cada cigarro que você fuma, é menos 11 minutos que você tem aqui na Terra...

— ... e mais 11 minutos perto do Senhor! — brincou Eduardo, fazendo cara de evangélico pobre.

— Quer saber? Vou continuar a ler meu livro do Bukowski. Por que você não vai até o banheiro logo?!

— Você tem toda a razão. Já tava esquecido com todo esse papo furado...


E foi. Já estava tirando do bolso apertado direito da calça jeans meio grunge uma carteira de Hollywood California, que segundo ele, era o cigarro “no grau” — nem forte, nem fraco. Eduardo pegou seu isqueiro que ganhara da namorada, que inclusive não gostava do fato de ele fumar, mas tinha de aceitar. Por isso dera o tal isqueiro liso cromado pra ele.


O ônibus estava indo para um show de rock. Uma banda que tanto Rômulo quanto Eduardo gostavam muito. Aerosmith. O vocalista já não cantava como antes. “Talvez por causa de toda a coca que ele cheirou”, ria Eduardo, sonhando com o espetáculo. De fato, quando se aspira cocaína, ela passa pelas cordas vocais e as prejudica. Muito. O mesmo acontece com o tabaco. Por isso que quem fuma tem aquela voz marcante.


“Não sei como porra ele tá lendo”, pensou Eduardo, irritado com o fato do amigo não estar nervoso com o show que começaria em pouco mais de cinco horas. “Vou é fumar outro cigarro pra ver se relaxo”. E entrou no banheiro.


Acendeu. Deu o primeiro trago. Seu corpo estremeceu de prazer. Logo a nicotina tomou conta de seu peito e a seguir de seu sangue. Abriu a janelinha pro ar circular. De repente, viu a paisagem lá fora ficar distorcida. Mais e mais. Rodando e rodando, até ficar de cabeça pra baixo. Ele rodou igualmente dentro da pequena cabine.


Seu braço esquerdo estava quebrado. Saiu da cabine, chorando de dor, com o cigarro no bico, pego do chão. “Rômulo!”, pensou. Foi em busca de seu amigo e logo a adrenalina tratou de amainar a dor no braço. Roqueiros de preto, roqueiros de preto, livro do Bukowski, roqueiro de novo, Rômulo. Morto.


Por estar sem o cinto, voou sem destino e quebrou o pescoço no chão, sem chances de adeus. Eduardo, chorando, gritava seu nome. Ele não acordava. Não reclamava mais. Nunca mais ele cantaria a música do filme Armageddon, cujo refrão começa com “I don’t wanna close my eyes”, já que ele fechara seus olhos para sempre. Eduardo pôs a mão em seu bolso, tirou um cigarro numa tremedeira peculiar, acendeu e disse: “Vou fumar mais rapidamente pra te encontrar, meu velho!”.


(Breno Airan)

domingo, 21 de fevereiro de 2010

Bloco dos retirantes carnavalescos

Era uma sexta-feira, véspera de Carnaval, já passavam das onze da noite, quando descemos daquele ônibus vindo de Maceió, do qual todas as pessoas me eram estranhas. Haviam algumas pessoas começando a curtir o Carnaval que olhavam estranho para aqueles retirantes maceioenses cheios de malas, colchonetes e ventiladores. Não entravam mais carros nem qualquer outro veículo naquelas ladeiras, aquela hora já existiam alguns blocos cantarolando seus frevos junto á poucos foliões, alegres, que começavam a usar suas fantasias. A cena era cômica, ouvimos várias piadas: - e aew gatinhas gostei da fantasia. Subimos ladeira, descemos ladeira, paramos, deixamos as malas no chão no meio das ladeiras, seguimos em frente, erramos o caminho, cansamos, reclamamos. Cada vez que parávamos no meio de uma ladeira vinha um bloco para atrapalhar nosso descanso e fazer com que seguissemos em frente, carregando o peso de todo Carnaval em nossas costas, peso das futuras alegrias, dos quatro dias de folia que seguiriam. Enfim, chegamos ao nosso destino e esse foi um começo de mais um Carnaval, com direito a muitas fantasias e máscaras, a gente nova e feliz, agora o peso não era mais das malas, que a essa altura já haviam sido desfeitas, era da música, da embriaguez, dos foliões e foi essa a primeira visão do Carnaval de 2010, a visão do cansaço tranformado em folia. Onde cada um possuia,suas mascaras, suas fantasias, seus frevos e seus blocos que se transformavam em um só.


Alana Berto